Nossa travessia do Vietnã para China não podia ter sido
melhor. O trem era muito confortável, ficamos com uma cabina só para nós dois,
a passagem pela temível imigração da China foi super tranquila (o procedimento
foi lento, entre a saída do Vietnã e voltarmos para o trem dentro da China,
demorou 3 horas, mas sem nenhuma complicação) enfim, fizemos uma ótima viagem.
Nós decidimos fazer 3 paradas na China (além de Hong Kong): Xian, Beijing e
Shanghai. Mas o nosso trem, vindo do Vietnã, só ia até Nanning, uma cidade no
sul da China. Chegamos em Nanning e fomos direto na bilheteria tentar comprar
os tickets para Xian. A comunicação na China é algo muito difícil, mas muito
mesmo! Ninguém fala inglês, as letras não passam de desenhos para nós e não tem
nada escrito em inglês. Felizmente um dos guichês tinha atendimento em inglês,
mas um inglês bem mais ou menos. A notícia ruim é que não tinha tickets para o
mesmo dia, só para o dia seguinte e ainda assim era na categoria “em pé”.
Lugares só estavam disponíveis para daí dois dias. Bom, saímos para pensar e
tentar uma outra alternativa. O problema é que não tinha alternativa. Com a
dificuldade da língua, não conseguíamos descobrir se tinha alguma rodoviária,
ou qualquer outro meio para chegarmos em Xian. No final das contas, decidimos
encarar a categoria “em pé” e compramos os tickets para o dia seguinte.
Nós não tínhamos a mínima ideia do que nos esperava e nossa
perspectiva é que fosse um vagão vazio (como um compartimento de cargas) com
todo mundo amontoado dentro e nos restaria sentar nas mochilas. Na realidade, o
vagão tem lugares para sentar e é o mesmo da categoria mais barata “hard seat”.
Ainda meio perdidos, sentamos nos assentos vazios mas depois de duas horas de
viagem os donos dos lugares apareceram. Utilizamos dessa estratégia até os
lugares serem preenchidos, mas já economizamos uma pequena parte da viagem.
Você pode tentar um upgrade de categoria, basta ter algum lugar disponível. Nós
tentamos, mas o trem estava lotado.
Digamos que nessa viagem nós sentimos a China na pele! A
categoria “hard seat” é onde realmente viajam os chineses, pois a maioria das
pessoas não têm dinheiro para ir nas classes melhores e menos ainda nos trens
rápidos. É a “geral” dos trens na China! Sendo assim, a convivência é intensa e
as pessoas se socializam bastante. É uma categoria super interativa! As pessoas
também são solidárias umas com as outras, e muitas vezes nos ofereciam seus
lugares para sentarmos ao menos um pouquinho, outras vezes se apertavam nos
bancos para nos dar um lugarzinho para sentar. Como éramos os únicos
estrangeiros no trem, as pessoas ficavam muito curiosas a nosso respeito,
tentavam conversar com a gente em chinês como se fosse a coisa mais normal do
mundo, pensando bem, para eles é normal, afinal são bilhões de pessoas que
falam chinês. Provavelmente também, as pessoas que estavam no nosso vagão
tinham pouco ou quase nenhum contato com estrangeiros, o que nos torna ainda
mais exóticos!
A medida que as horas passam a viagem vai ficando mais
interessante (mais cansativa também). Lá pelas tantas, um menininho estava
ensinando o Manu contar até 10 em chinês, um casal estava tentando descobrir de
onde éramos, outros falavam comigo um pouco em chinês e algo que deveria ser
inglês.
De repente, você olha ao redor e se formou uma roda
animadíssima de conversa, com pessoas rindo em uma língua que você não tem nem
ideia. Crianças passam de um lado para o outro, pulam, brincam. Os estreitos
corredores são divididos entre os passageiros que não têm onde sentar, os
vendedores de comida e das mais variadas tranqueiras (até lembrei do “alicate
mondial, na minha mão é 5 reais”, que tanto ouvimos nos trens de São Paulo) e
por aí vai.
Passam algumas horas e o cansaço vai tomando conta das
pessoas. Nós mesmos tentamos encontrar algum cantinho, a Dri ainda conseguiu a
beirada de um banco, mas o Manu dormiu sentado no chão do corredor por um
tempinho.
Os chineses são muito curiosos também. Sempre estão
bisbilhotando o que você está lendo, ou olhando no seu celular. A Dri estava
lendo um livro e sempre tinha alguém no “cangote” curioso para saber o que ela
estava lendo, mesmo que as letras não fizessem o menor sentido. Eles também
ficaram maravilhados quando nós compramos comidas e comemos com hashi! Tinha
uma rodinha só esperando que a gente não conseguisse e quase não acreditaram na
nossa habilidade (mal sabem eles que nós já estamos há 5 meses na Ásia e temos
um monte de restaurantes japoneses no Brasil)!
Ao todo foram quase 35 horas de viagem. Foi bem cansativo e
no final estávamos destruídos. Por outro lado, foi bem melhor do que
imaginávamos e achamos uma experiência bem interessante (claro que para uma
vigem mais curta). No fim das contas, passamos mais tempo sentados que em pé e
podemos dizer que conhecemos o âmago da sociedade chinesa!
Nessa hora o trem estava vazio
Completando umas 30 horas!
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